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terça-feira, 1 de dezembro de 2015

Z- parte 9

Myca não havia percebido que eu estava tentando parecer o mais natural possível depois daquele episódio que ainda não sei dizer se foi de insanidade ou um pequena dose de realidade havia me acontecido. Eu tinha praticamente um vizinho, que agora, fazia questão de ser meu colega de quarto perfurando minha parede e vomitando um monte de informação que não fazia a minima ideia se eram reais ou não:

- Z... Tudo bem?
- É... Tudo! Tudo ótimo, Myca! E... - Pensei rápido. - E as coisas? Como vão?
- As coisas?
- Sim! Todas elas!
- Você dormiu essa noite, Z?
- Claro! Nunca dormi tão bem!
- Talvez seja isso - Rasgou uma nova voz vinda da porta do quarto. - Então... Esse é o famoso?
- Ah... Sim, Doutor... Deixe-me apresentá-los. Z, este é o Doutor Rui. Ele é o encarregado por todo este lugar.

Captando o meu olhar interrogativo, Dr. Rui estendeu a mão e me lançou a resposta como se pudesse ler meus pensamentos:

- É um prazer, Z! Está se perguntando o por quê de nunca me ver por aqui. Mas já te digo de antemão que sou um homem muito ocupado e infelizmente não posso cuidar do meu bem mais precioso que é este local. Por isso deixo Myca e Nitch por aqui, eles são meus olhos enquanto estou fora.

- Desculpe a indelicadeza, Doutor. Mas o que é este lugar? O que vocês fazem aqui exatamente? E por que não chamam este local por um nome?

- Oh, perguntas... Muitas perguntas! Venha! Eu vou te mostrar...

Dr. Rui apontou para a porta e eu segui a indicação. Como sempre eu buscava respostas sobre tudo a minha volta e se ele era o dono delas eu precisava segui-lo naquele momento. Talvez o tal do Y fosse só um doido varrido.
Paramos no primeiro quarto logo ao lado do meu, supostamente aquele era o quarto do Filipe, ou Y:

- Este é o Y.

Então era verdade, ele realmente era um interno como eu e também tinha recebido um nome de letra:

- Y? Por que vocês nos dão nomes com letras?

- Por que vocês são 26.

- Espera, existem mais 24 pessoas como eu aqui? Todos sem memória, sem saber quem são?

- Não, todos morreram.

Fiquei paralisado com a informação enquanto encarava Filipe que me olhava com um olhar um pouco assustado. Filipe não era alto, possuía uma barba por fazer, cabelo curto, um corpo de um cara normal, mas era visível que era muito esperto só pelo olhar. Ele realmente parecia o tipo de cara que na hora de um aperto era capaz de fazer leite jorrar de pedra:

- Você está falando sério?

- Não! hahaha!

- Nossa, que alivio! Eu realmente fiquei assustado!

Dr. Rui seguiu em frente e a porta do quarto de Y se fechou. Fui atrás dele ainda curioso. Quando passamos por outros quartos realmente pareciam vazios, era como uma mansão com inúmeros quartos onde só um casal vive.
Em certo ponto de nossa caminhada e conversa passamos por um quarto que me chamou atenção, ao chegar perto pude ouvir um som de passos vindo em disparada na minha direção e de repente um estrondo contra a porta. Parecia que o que estava ali dentro sabia que eu estava parado ali na frente mesmo com o quarto aparentemente apagado e a porta fechada. Eu conhecia os quartos, morava em um aliás, sabia que não havia como ver nada do outro lado e nem ouvir as vezes. Mas essa coisa conseguia me sentir:

- Z, é melhor se afastar desse aí... - O Doutor estava atrás de mim me puxando para sair de perto. -Ele não é muito estável. Não queremos que essa porta se abra nem por acidente, ok?

- Mas o que era aquela coisa?

- É só mais alguém que perdeu o nome e tem um temperamento um pouco forte, logo ele se acalma.

Eu senti o meu medo sendo puxado pra dentro daquelas paredes como se ele tivesse pego meu corpo e devorado me dilacerando com as próprias mãos, porém, ao mesmo tempo eu senti a vontade de fazer o mesmo com ele. Nunca me senti daquela forma.
Dr. Rui era uma pessoa agradável de se conversar, o típico chefe legal. Brincava, ironizava coisas, ria... Até que chegamos numa sala com um enorme monitor onde Myca e Nitch estavam afobados como se preparassem alguma cerimonia:

- Z, você perguntou o nome desse local, não é?

- Sim!

- Chamamos este local de laboratório...

- Laboratório? De que?

- De pessoas. Você é uma experiência e começou a me causar problemas.

- Como assim? O que eu fiz? Quem são vocês? O que fizeram comigo?

Ficando em histeria comecei a querer correr, fugir daquele lugar, mas minhas pernas pareciam não me obedecer. Meus próprios gritos começaram a ficar abafados aos meus ouvidos, a visão foi ficando turva. Breu.Tentei lutar contra aquilo e vi tudo em câmera lenta e sem som, o Dr. Rui me arrastava até a cadeira que havia no centro da sala, uma cadeira que parecia cirurgica. Me pôs sentado. Tudo se apagou.

segunda-feira, 16 de novembro de 2015

Z - Parte 8

O coração estava acelerado. Poderia ser qualquer um ali atrás daquela parede. Um rato talvez? Não... Ratos não batem na parede. O Nitch me pregando uma peça Não... ele não é de brincar sem te olhar nos olhos... Recostei a cabeça na parede tentando ouvir os barulho que cessaram por um momento. Ao encostar a orelha na parede acolchoada vi a morte ou a quase morte passar diante dos meus olhos. Uma lâmina aparentemente muito afiada atravessou a parede bem na frente do meu rosto. Centímetros para a direita e eu seria um cadáver com uma faca atravessada no cérebro.
Num pulo para trás por causa do susto fui capaz de ainda ver a lamina voltando e de repente um chamado inesperado:

- Psst... PSSSST!

Olhei para os lados tentando ver se não era alguma brincadeira ou mais um sonho doido:

- Ei... Vizinho.. Está aí? Ouvi quando você deu uma batida na parede, sei que deve ter alguém... - A voz ficou calada. - Espero que não seja o Nitch ou a Myca, eu estaria em apuros...

Num impulso voltei para perto da parede e resolvi me socializar com a vizinhança inesperada:

- Você quase me matou!
- Oh, então você está aí... Desculpe por te assustar.
- Não foi de susto, você quase atravessou essa coisa pela minha cara.
- E o que você estava fazendo com a cara na parede? Tá achando que é algum tipo de telefone ou o que?
- Engraçadinho... - Por algum motivo, aquele cara já me irritava com o jeito sarcástico de ser com alguém que ele acabara de começar a falar. - Mas então... Você trabalha aqui?
- Sim, trabalho. Sou o furador de paredes oficial desse lugar, às vezes fico entediado e furo crânios alheios... Claro que não, seu estúpido! Assim como você também estou preso neste lugar.
- Preso?
- Vai me dizer que você acredita que estão te ajudando?
- Mas é claro que estão! Eu já comecei até a lembrar algumas coisas da minha vida antiga!
- Ahahahaha! Sério? Que mágico! Estou feliz por você, cara! Parabéns!
- Você está sendo sarcástico de novo, não é?
- E você consegue ser um gênio mesmo sendo tão burro. Acorda, cara! Presta atenção! Quantas vezes você foi apagado assim que estava descobrindo algo de importante sobre esta espelunca?
- Bem, acho que...

Aquilo já havia se passado na minha cabeça quando desconfiei pela primeira vez desse lugar. Mas, com o tempo comecei a confiar novamente na dupla que cuidava de mim o tempo todo. Mas será que é realmente cuidado isso tudo?

- É, já perdeu as contas, né chapa?
- Por que você acha que tem algo errado?
- É só você olhar em volta... Parece teoria da conspiração, mas é só o que esse lugar me mostra...
- E como você sabe ou... ACHA que sabe disso tudo? Como sabe que não foi "apagado" como você diz e acordou desse jeito?
- Simples, brother... Eu finjo que não sei de nada e não preciso mais ser apagado. Fim! algo de ruim está acontecendo aqui e eu preciso que me ajude a sair desse lugar. Até deixo você sair comigo.
- Entendi... E eu saio e vou para onde se não lembro nem meu nome?
- Você vai lembrar, só parar de ser esse manézão e começar a fingir... Agora eu tenho que ir que já tá quase na hora.
- Hora de que?
- Myca vai passar na sua cela..
- Quarto! - Interrompi.
- Como quiser... E o Nitch no meu pra ver se está tudo bem. A propósito, antes de desligar nossa ligação aqui... Como te chamam?
- Z... E você?
- Y. Mas meu nome é Filipe. Me chama como achar melhor, falou? Agora vou desligar. Beijo, tchau!

O pequeno buraco na parede se preencheu com estofado novamente como se ele tivesse posto uma tampa do outro lado. Ou como se minha imaginação tivesse criado tudo aquilo. Não se passou nem um minuto desde que ele falou tudo aquilo e a porta do meu quarto se abriu revelando Myca. Ele estava certo sobre isso... Palpite? Sorte? Alucinação? Eu teria que investigar mais a fundo para saber. Mas aparentemente, tenho um novo companheiro ao lado que pode ter algumas respostas.

sábado, 1 de agosto de 2015

Z - Parte 7

Myca colocou uma caneca de chá quente sobre a mesa e a empurrou até mim. Eu estava com o olhar um pouco vago olhando para o nada e sem esboçar muita reação a nada a minha volta:

- Vai, Z. Bebe um pouco de chá...
- Hum? Ah, obrigado, Myca...
- Então?
- Então...? - Retruquei.
- Quer me contar?
- Eu ainda  não sei
- Não sabe o que exatamente?
- Não sei se tudo que se passa é um sonho ou são memórias. Às vezes não tenho certeza nem de estar acordado. O que me garante que isso aqui é real? Como posso saber que não vou ser acordado novamente no meu quarto daqui a pouco?
- Olha Z... - Myca estendeu a mão colocando-a sobre a minha. - Eu sei que tudo deve estar bastante confuso pra você nesse momento. Mas eu posso te garantir que tudo isso aqui é real sim. Você não sente o calor do chá quando bebe? Não está sentindo que estou tocando em você?
- Sim. Mas...
- Mas...?
- Mas toda vez que tenho esses... Sonhos ou sei lá o que quer que sejam tudo parece tão real...
- Tem algo que você ainda não nos contou?
- O que realmente aconteceu no dia do exame, Myca?

Ela se ajeitou na cadeira, olhou fixamente para a caneca de chá que estava em sua mão, respirou fundo e em seguida me lançou um olhar um pouco triste:

- Naquele dia os exames corriam bem até o momento da entrevista...
- Você diz a hora que o Nitch começou a me fazer as perguntas finais? -Interrompi.
- Isso. Você pareceu um pouco nervoso e teve uma pequena convulsão e apagou. Nós o levamos até seu quarto e lá esperamos você acordar quando de repente você começou a se debater na sua cama até finalmente nos ver ali ao seu lado.
- Eu não sei dizer até que ponto foi real...
- O que, Z? - Perguntou com uma evidente curiosidade na voz.
- Eu me lembro de algumas perguntas... Mas deixa pra lá...


Qualquer que for a verdade sobre o que aconteceu, algo me incomodava sobre a forma que estavam mostrando interesse em apaziguar o que aconteceu no dia dos exames. Eu estava desconfortável. Desconfiado. E isso não me parecia algo bom. eu precisava me certificar. Mas como? Não posso andar sozinho por este lugar. Se há alguém além de mim aqui dentro talvez também não saiba da minha existência. Preciso ficar atento, observar turnos, padrões... Em algum momento quando eu saio, outro alguém pode entrar e assim acontece a mágica. Eu realmente quero respostas, mas na minha cabeça só me vem perguntas. Então está na hora de eu ir atrás do que eu vim procurar.
Passei a semana seguinte observando tudo de diferente de dentro do meu quarto, sons, movimentações externas, conversas rápidas enquanto Nitch e Myca passavam pela porta da minha "prisão". Já não era mais uma pulga atrás da orelha, era um carrapato bem grande me sugando todo o sangue do meu cérebro e aquilo estava me consumindo. Eu passei a evitar dormir algumas vezes só para tentar notar algo estranho ao meu redor. O cansaço venceu:

- Z?
- Myca?

Eu não podia ver nada, estava tudo escuro e lá no fundo eu podia ver uma fraca luz, algo parecido com uma vela acesa. Eu comecei a caminhar até ela:

- Não se aproxime!
- Mas... Quem está aí? Eu preciso saber quem é você!
- Você tenta descobrir quem sou eu... Mas e você, quem é?
- Eu... Não sei...

No meio daquela escuridão comecei a ouvir leves batidas ocas, cadenciadas, que começavam a aumentar de pouco em pouco. De repente as  batidas entravam na minha cabeça fazendo um estrondo, pareciam bombas caindo. Quando acordei estava sentado no chão com o corpo encostado contra a porta. Passei tanto tempo ali que não percebi que apaguei de cansaço naquele lugar. Desnorteado com o sonho nada esclarecedor tentei me levantar. Droga, minha perna adormeceu. Camableei quase caindo, e num baque seco choquei meu corpo contra uma das paredes do quarto. Tomara que não tenha alarmado nem a Myca nem o Nitch.
Meu coração congela. Um frio passa pela minha espinha e sinto uma sensação de euforia que não podia explicar... As batidas que eu ouvi... Eram reais! Estavam ali. Atrás de mim. Alguém estava tentando se comunicar. Tem alguém atrás dessa parede.

domingo, 12 de julho de 2015

Z - Parte 6

- Z, assim que você estiver pronto nós começamos, ok?

Era a hora de começarmos a vasculhar minha cabeça para encontrar esse "Eu oculto". Quem estava encarregado de monitorar o exame todo era Nitch. Myca o auxiliaria durante todo o processo caso algo aconteça comigo. Espero que tudo corra bem:

- Tudo ok, Nitch.
- Ótimo!

Seguimos para a sala de exames e lá fui instruído a ficar sentado. A minha frente havia uma tela onde de acordo com Nitch, passariam imagens a cada 15 segundos e eu deveria relacioná-las com pelo menos três coisas que viessem na minha mente. Enquanto me explicava, Nitch ia colando eletrodos pelo meu corpo:

- Bom, a ideia é forçar sua cabeça para que aquele aparelho ali possa captar sua atividade cerebral e de repente nos dar alguma resposta sobre seu "problema" de memória.
- Entendi. E tem algum risco?
- No máximo uma convulsão leve... Ou quem sabe duas!
- Nossa, me conforta muito! - Disse ironicamente. Óbvio.
- Z, durante o exame vou te fazer algumas perguntas também, ok?
- Não sendo de matemática...
- Ah, droga! Eu estava com algumas duvidas em equação de segundo grau e pensei que você poderia me ajudar... É, cancelem os exames!

Uma característica que eu adorava em Nitch era seu bom humor. Ele sempre sabia rebater situações, piadas, comentários de forma bem humorada independente da situação. Após terminarem os preparativos o teste se inicia. Durante o exame percebi que ambos, Nitch e Myca estão com uma aparência preocupada e apreensiva ao mesmo tempo. Não sei dizer se isso é bom ou ruim, não os conheço há tanto tempo assim para saber sobre o que significa cada mudança facial deles:

- Crianças. Brincadeira. Sorriso
- Ok, próxima.
- Familia. Trabalho. Casa.
- Está quase acabando essa etapa. Próxima!
- Lágrimas. Dor... - A memória falhava - Não consigo completar...
- Tudo bem, Z. Agora vamos intensificar o exame, vou forçar mais seu cérebro, tudo bem?
- Se minha cabeça explodir a culpa é sua!
- Se isso acontecer eu pego o vídeo das câmeras de vigilância, coloco uns efeitos bem maneiros e posto no youtube, fica tranquilo.
- Tem horas que você me assusta, Nitch!

Nitch pegou um estroboscópio, uma aparelho que emite luzes piscando de forma alternada podendo se programar a velocidade de alternância dessa luz e o virou direto para mim. A ideia agora continuava sendo olhar as imagens, só que agora com aquele aparelho piscando freneticamente na minha cara. O exame correu bem. Como avisado de início eu deveria responder algumas perguntas já sem a influência das imagens ou do estroboscópio. Nitch posicionou um gravador ao nosso lado para registrar caso algum avanço fosse feito:

- São Paulo, 12 de Julho de 2015. Teste com o Paciente "Z". Inicio: 16:00. Vamos lá. Pode me dizer seu nome?
- Z
- Não, seu nome verdadeiro!
- Não consigo... ainda não vem nada.
- Quem é Camila?
- Acho... Que ela era minha esposa.
- E o que mais?
- Não me vem mais nada na cabeça...

- Você se lembra de alguma coisa?
- Não, tenho lapsos de memória mas nunca sei o que realmente é meu ou minha imaginação me pregando peças.

Após uma série de respostas inconclusivas, Nitch resolveu dar o exame por encerrado. De acordo com os aparelhos eu não tinha nada além de uma confusão mental, coisa que pode acontecer caso haja algum trauma com o paciente, seja ele físico ou psicológico. Z continuava sendo um mistério naquele lugar. Mas eu ainda tinha perguntas:

- Nitch...
- Sim?
- Você fez uma gravação no início e me identificou nela. Se há necessidade de identificação significa que eu não sou o único aqui?

Nitch e Myca simultaneamente se entreolharam com uma expressão assustada. Como se eu tivesse descoberto alguma coisa que eles estivessem aprontando:

- Não! Sim! Sim... Existem mais... - Disse Nitch, embaraçado.
- "Existem"? Então é mais de um.
- É... São... - Myca acabou entregando.
- Entendo... Você também disse a data de hoje no começo...
- 12 de Julho de 2015?

Fiquei parado por um tempo, talvez minutos. acho que perdi a noção do tempo. Ao ouvir a data fui transportado para dentro da minha cabeça. Vi crianças correndo, vi a mesma Camila do meu sonho, vi balões e rostos borrados. Era uma festa, quando voltei a si estava deitado no meu quarto. Nitch e Myca ladeavam a cama e me chacoalhavam chamando meu nome:

- Z? Você está bem? - Perguntava Myca afoita.
- Sim... Que dia é hoje, Nitch? - Perguntei num salto, me sentando na cama.
- Hoje? 12 de Julho. Mas...
- Hoje é meu aniversário...

 Nitch e Myca simultaneamente se entreolharam com uma expressão assustada.

quarta-feira, 8 de julho de 2015

Z - Parte 5

Tomei um banho. estava completamente ensopado de suor devido à turbulência do sonho (ou pesadelo) desta noite. Ainda era madrugada e somente eu estava acordado. Myca disse que estaria me esperando após o banho para fazer alguns exames e conversar caso eu precisasse.
Fiquei me questionando e tendo alguns lapsos de memória sobre aquele sonho. Ele já não me assustava mais como de momento, mas eu buscava alguma razão ou sentido para toda aquela desordem.
Saí do banho e fui direto ao quarto ao lado me trocar:

- AAAAAAH!
- Myca?! Que... Que você está fazendo aqui?!
- Eu falei que ia esperar você, que iamos conversar, lembra? - Dizia a garota embaraçada com a situação enquanto virava de costas com as mãos sobre os olhos.
- Tudo bem, mas você não podia esperar lá fora?
- Lá fora? É... Claro! Lá fora! - E saiu correndo deixando para trás todos seus apetrechos médicos, como luvas, estetoscópio, prancheta de anotações...

Após o ocorrido comecei a rir. Me vesti. Fui ao encontro da garota mais atrapalhada e igualmente meiga que se lembrava de conhecer em toda minha vida.

Ao chegar ao refeitório, onde havíamos marcado de nos encontrar para conversar, Myca estava com o olhar fixado em sua caneca com chocolate quente e batia o pé no chão de forma inquieta. Cheguei calmamente colocando seus itens sobre a mesa:

- Você esqueceu isso...
- Olha, me desculpa por aquilo. Eu achei que talvez você precisasse de algu...
- Myca! Calma, esquece aquilo. Não tem problema. Foi engraçado até. Vamos apenas esquecer, certo?
- C-Certo!... - Concordou, ainda um pouco acanhada. - Então, me conta como você está se sentindo...
- Sinceramente? Não sei... Você já se sentiu como se você não fizesse parte do próprio corpo?
- Pra ser sincera, não...
- É um pouco difícil entender mesmo... - Dando uma breve pausa enquanto procurava uma forma de se explicar - Parece que não faço parte da minha própria história, as memórias estão querendo vir até minha mente mas elas não se encaixam. Eu não sinto como se elas fossem minhas.

A expressão de Myca havia mudado para uma muito mais preocupada:

- Isso pode ser algo até mesmo patológico. Nós devíamos fazer uma bateria de exames em você para tentar descobrir o que está acontecendo dentro da sua cabeça. Você topa?
- Claro! Qualquer coisa para saber quem eu sou de verdade!
- Então, eu vou preparar tudo para que possamos te examinar.
- Obrigado por tudo, Myca.

A garota se levantou e foi em direção a porta. Antes de deixar o local ela se virou repentinamente:

- E, Z...
- Hum?
- Vamos consertar você!
- Ahah! Eu espero...

E então deixou o local com a pressa inicial enquanto Z permanecia tomando sua caneca de chocolate quente.

A garota apresentava uma inquietação fora do normal, correu até a sala de exames procurando a unica pessoa que poderia ajudá-la sobre o que fazer no momento:

- NITCH!
- O que foi, Myca? Que susto!
- Ele está começando a se questionar! - Disse a garota com um certo medo na voz.
- Isso não é bom...